Historiador quer elaborar mapas sobre tráfico negreiro no interior
Investigador angolano (à direita) na conferência sobre Simão Kimbangu em Kinshasa
Fotografia: Jornal de Angola
O vice-presidente do projecto internacional “A Rota dos Escravos”, Simão Souindoula, disse ontem em Luanda que o estudo e a elaboração de mapas das diferentes rotas das caravanas do tráfico de escravos do interior para o litoral de Angola é uma das tarefas que vai merecer maior atenção no próximo ano.
O historiador, membro do Comité Científico da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), considerou importante a elaboração dos mapas, cujos trabalhos deviam começar este ano, por permitir mostrar que o tráfico negreiro atingiu não só as populações do litoral, mas todos os territórios que formam a República de Angola.
Os registos sobre o comércio esclavagista realçam as populações “Congo e Angola” para designar os africanos que saíam de Angola, dando primazia aos do litoral, mas “houve escravos nganguela, cuanhama, kuvale, cassanje e de outros grupos etnolinguísticos de Angola, que raramente são mencionados nos documentos do Novo Mundo”, aflorou Simão Souindoula, dizendo que se trata de um assunto importante para o país: “é algo nacional e não só dos povos do litoral.”
As proveniências desses povos, no outro lado do Atlântico, desapareceram e prevalecem os nomes do litoral, como Moçâmedes, Benguela Velha (Kwanza-Sul), Benguela, Luanda, Malembo e Mpinda (Cabinda), referentes às zonas em que eram recolhidos pelas embarcações e “por isso é um assunto que deve merecer a atenção de toda a Nação angolana”.
O historiador considerou um sinal importante, e contra o racismo, a declaração da Assembleia Geral das Nações Unidas, ao consagrar 2011 como Ano Internacional das populações afro-descendentes.
Em declarações ao Jornal de Angola, o historiador, que fazia um balanço das actividades desenvolvidas este ano, disse que a decisão das Nações Unidas teve impacto a nível da diplomacia internacional e visa valorizar e enaltecer as comunidades afro-descendentes.
Balanço positivo
O historiador considerou positivo o balanço das actividades desenvolvidas, com o apoio do Triângulo Turístico e Histórico-Cultural Kanawa Mussulo, tendo destacado participações em eventos internacionais e nacionais, além da sua dedicação à investigação e documentação científica.
Dissertou sobre temas inéditos, ligados à instalação e evolução no continente americano e no conjunto insular caribenho dos cativos, originários do Reino do Kongo e da colónia de Angola.
Na Universidade Agostinho Neto, em Luanda, e na Universidade 11 de Novembro, em Cabinda, numa iniciativa da Fundação Eduardo dos Santos, expôs uma síntese que revelou o povoamento angolano nas Antilhas Holandesas, consequência da dominação da região, em meados do século XVII, pelos holandeses, o controlo dos cabos “Luyt Hoek” e “Boomtjes Hoek” e a organização das cidades de “Rudolphstadt” e “Grantville”. Na vertente internacional, participou na última reunião do Comité Científico da UNESCO que teve lugar em Bogotá e Cartagena das Índias, na Colômbia, em que uma das decisões saídas foi o fortalecimento da cooperação entre o Projecto da “Rota” e o Triângulo Kanawa Mussulo, em Luanda.
Souindoula referiu também a criação do projecto de montagem de uma galeria sobre “As Rotas angolanas da Escravatura”, apresentado na IV Conferência sobre o Museu Integrativo, que se realizou na Universidade de Witwatersrand, em Joanesburgo, em Junho e Julho.
O historiador participou em Kinshasa e em Nkamba, na Conferência Internacional sobre Simão Kimbangu, subordinada ao tema “O homem, a sua obra e a sua contribuição ao processo de libertação do homem negro” e cooperou, igualmente, no colóquio internacional sobre África, que teve lugar no Canadá, na Universidade de Iorque, sob o lema “África Aqui, África Ali”, em que apresentou o texto “Rei do Congo/Rei de Maracatu ou a forte dinâmica de imanência política africana no espaço atlântico”.
Colaborou no colóquio internacional sobre “As culturas afro-americanas e a música”, em Montevideu, com a comunicação intitulada “Kantika vissungos ou a influência estruturante dos ‘works songs’ na música afro-americana e afro–caribenha”, e não menos importante foi a proposta “As rotas angolanas da escravatura e o turismo de memória dos afro-descendentes”, apresentada na Cimeira Mundial dos Afro-descendentes, nas Honduras, em que sugeriu a classificação da Ilha do Mussulo como património da humanidade.
Francisco Pedro | - 25 de Dezembro, 2011
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