terça-feira, 29 de setembro de 2015

Movimento Negro brasileiro lutas da Diáspora africana

 

O Movimento Negro brasileiro, lutas da Diáspora Africana

Nesse momento os angolanos em vários locais do mundo se unem numa frase: “Liberdade Já!”, pedindo a liberdade para os presos políticos de Angola. Jovens que se reuniam numa casa em Luanda, capital de Angola, estudantes, professores e jornalistas, que se opõem ao presidente José Eduardo. Segundo os ativistas organizavam manifestações pacíficas.

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A acusação do governo sob suspeita de conspirar e tramar a derrubada do presidente José Eduardo dos Santos, no poder há 36 anos.

As provas apresentadas pela polícia foi um livro “Da Ditadura à Democracia” do escritor americano Gene Sharp, usado durante a “Primavera Árabe”. Especula-se que o medo de uma Primavera Angolana, num país em crise econômica, tenha levado o governo a agir.

Mães de presos

Há cem dias um grupo de mulheres e parentes dos 15 prisioneiros, jovens de 18 a 37 anos, mantidos em celas solitárias desde junho se mobilizam .

A tarefa de chamar a atenção da população, num país onde imprensa, cortes e sociedade civil são dominados pelo Estado é das mais difíceis. "Queremos que a comunidade internacional pressione, só assim o governo ouve", diz Marcelina de Brito, cujo irmão, o professor Inocêncio, 29, é um dos presos.

As mulheres fizeram duas manifestações em Luanda, ambas reprimidas pela polícia. "Vieram com porretes, soltaram os cães em cima de nós".

O governo afirma que o grupo tinha planos de convocar uma "insurreição".

"As consequências desta rebelião seriam incalculáveis. Seria como uma bola de neve. Inicialmente podia ser que nada acontecesse, mas também podia acontecer tudo e, como se diz, mais vale prevenir do que remediar", disse o vice-procurador-geral da República, Hélder Grós

No dia 28 de agosto houve manifestações em apoio aos presos políticos, em Luanda, Lisboa, Berlim e São Paulo. Manifestantes angolanos, defensores dos Direitos Humanos e do movimento da Diáspora uniram-se ao pedido de: “Liberdade Já! ” .

O que ocorre em Angola? Conversando com diversos militantes dos movimentos negros brasileiros, a primeira pergunta que surge: “Quem está contra é de direita? ”

Essa pergunta é extremamente pertinente, principalmente dos antigos militantes dos movimentos negros. Durante os anos de Ditadura Militar aqui no Brasil, havia uma ligação da iniciante organização do chamado “Moderno Movimento Negro” iniciado nos anos setenta com os movimentos de libertação africana.

O Brasil da Ditadura (mascarada com eleições indiretas no Congresso) tinha como estratégia a ocupação dos espaços políticos e econômicos das antigas metrópoles na África. Principalmente os países colonizados por Portugal. Uma controvérsia onde se reprimia a oposição, com cadeias, extermínios, assassinatos de prisioneiros, torturas, força policial e militar, abria-se uma via diplomática com movimentos revolucionários de esquerda.

Nós na época jovens entrávamos em contato com participantes, da Frente de Libertação de Moçambique FRELIMO, com angolanos participantes do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) que havia conseguido sua liberdade em 1974/75. Na época em São Paulo e em vários estados brasileiros, questionávamos a comemoração dos “Noventa Anos” da chamada Abolição que ocorreria no dia 13 de maio de 1978. O 13 de maio era comemorado com o governador indicado pelo presidente militar, e a chamada “comunidade negra” que apoiava os militares, ou que dizia que: “não devemos contestar a ditadura militar pois não é problema nosso”. O saudoso poeta professor Eduardo de Oliveira resumia muito bem: “Não podemos nos considerar uma comunidade, uma comunidade se apoia, se ajuda. Infelizmente não existe comunidade negra. ”

Além de termos contestados em 1978 as comemorações do 13 de maio, no dia 7 de julho ocorreria o ato no Teatro Municipal para a criação do Movimento Unificado contra a Discriminação Racial, que mais tarde se tornaria o Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial.

O primeiro Caderno Negros editado em 1978, teve poesias de Cuti (Luiz Silva) e Hugo Ferreira, encenadas num teatro francês alternativo, como demonstração de críticas sociais e exclusão da população negra no Brasil.

Além de mera lembrança de um velho militante, surgem agora documentos que a repressão da ditadura: “Com medo de que a luta pela igualdade racial crescesse à luz de movimentos internacionais como o Panteras Negras e se voltasse contra a polícia, a ditadura passou a seguir os passos de militantes e reuniões do embrionário movimento negro brasileiro”

“Havia uma preocupação da ditadura de que ideais do movimento armado Panteras Negras, por exemplo, e da luta dos direitos civis americanos pudessem chegar aqui. Por isso, o regime acompanhou vigilantemente manifestações políticas e encontros. ” (Segundo a socióloga Flavia Rios, autora da tese Elite Política Negra no Brasil: Relação entre movimento social, partidos políticos e estado.) Angela Davis que foi a grande musa nos anos 70 esteve várias vezes no Brasil, expressando-se em português.

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A preocupação não era só com os negros americanos. Os arapongas da ditadura relatam no segundo semestre de 1978 em Salvador, “agitadores angolanos no movimento negro, caracterizados como refugiados da guerra civil”. Ruth Neto irmã do presidente Agostinho Neto esteve no Brasil, e entrou em contato com militantes do movimento negro.

Estima-se que 42 dos 434 mortos e desaparecidos políticos durante a ditadura eram negros. E o que é ser negro no Brasil, uma auto definição e uma postura política. A definição de si (auto definição) e a definição dos outros .... antes de tudo uma posição política. (professor Kabengele Munanga)

Durante a formação dos novos partidos, tentando evitar-se a dispersão dos militantes da oposição contra a Ditadura Militar, surgia em São Paulo a “Frente Negra Para Ação Política de Oposição” cuja sigla “FRENAPO” remetia-se a “Frente Negra Brasileira” e a “FRELIMO” de Moçambique.

Em fevereiro de 1990 faziamos uma comemoração à libertação do preso político mais importante da África do Sul, Nelson Mandela, em plena Praça da Sé em São Paulo chamada Festa da Liberdade.

Festa da Liberdade

Um pouco antes das eleições na África do Sul, Mandela veio pessoalmente ao Brasil em agosto de 1991, para buscar apoio político no caso de vencidas as eleições, fosse impedido de assumir. Em 1995 as centrais sindicais sul africanas (pós Apartheid) e norte americanas vieram ao Brasil, para organizar a participação nas comemorações do Tricentenário de Zumbi dos Palmares. Não se comemora o treze de maio, questiona-se o catorze de maio dia seguinte da “abolição” ou exclusão do descendente de negros (escravizados) indígenas ou africanos, que vivem nas periferias do sistema.

Havia uma preocupação de uma visão pan-africanista dos dois lados do Atlântico.

E agora o que ocorre em Angola?

Nada melhor que uma explanação clara de quem acompanha os acontecimentos em Portugal e Angola. Encontramos essa visão no artigo “O rap e o ativismo pelos direitos humanos em Angola - parte 1” da Professora Doutora Susan de Oliveira em Literatura da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Brasil.

“Nos últimos cinco anos, entre 2011 e 2015, observamos o aparecimento e a frequência de protestos políticos em Angola, notadamente em Luanda, organizados por jovens sem filiação partidária direta ou militância institucional. Em 2013, esses jovens ficaram conhecidos como fundadores do Movimento Revolucionário Angolano (MRA) e fazem parte da geração que soma a herança de duas guerras, a de Independência (1962-1974) e a Civil (1975-2002) e que estão, portanto, vivendo um recentíssimo período de paz ao mesmo tempo em que percebendo o limite do que restou do projeto de nação após esses conflitos. Eles são os descendentes dos revolucionários que dedicaram suas vidas à luta pela independência que culminou no atual regime o qual se anunciava socialista e democrático em seus primórdios, mas mostrou-se o contrário disso ao longo dos anos. Hoje, essa geração mais jovem enfrenta, sem perspectivas, as mazelas de um país capitalista e profundamente desigual que prospera economicamente e cultiva, a despeito disso, um caos social decorrente da falta de políticas públicas em vários setores - como saúde, educação, habitação, saneamento básico, emprego - e do ataque sistemático aos direitos humanos promovidos pelo atual governo de José Eduardo dos Santos que assumiu o poder em 1979, sucedendo a Agostinho Neto (1974-1979), então falecido. O MPLA que governa desde 1974, sendo José Eduardo dos Santos o presidente nos últimos 36 anos, enfrenta por seu turno a indignação de opositores entre os quais os partidos históricos UNITA e FNLA, e os mais recentes BD (Bloco Democrático), CASA-CE (vConvergência Ampla da Salvação de Angola), PDP/ANA (Partido Democrático para o Progresso/ Aliança Nacional de Angola) e esse jovem Movimento Revolucionário apartidário que expressa a revolta social com mais veemência que os cinco partidos políticos juntos.”

Num momento em que imigrantes, refugiados de guerra, e estudantes, da Diáspora Africana vivem no Brasil e sofrem além dos problemas de adaptação o xenofobismo, racismo e intolerância. Podemos citar desde o ataque em 2012 aos estudantes angolanos no Brás onde foi assassinada a jovem formada Zulmira Cardoso, que se preparava para retornar a Angola, aos ataques com espingarda de chumbinho aos haitianos na Missão de Paz em São Paulo, e o ataque ao senegalês em Santa Maria no RS em 2015.

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Mães, irmãs, manifestações em Luanda, Lisboa e São Paulo – Brasil

Ao pedido de solidariedade, em defesa da liberdade de expressão é que nos juntamos à solidariedade mundial pan-africanista: Liberdade Já! Aos presos políticos de Angola

 

Fontes: - Jornal Folha de São “Angolanas expõem abuso de presos políticos” artigo de Fábio Zanini Colaboração para a Folha, em Luanda

- Carta Capital: “Como a ditadura perseguiu militantes negros” artigo de Marsílea Gombata

- Buala: “O rap e o ativismo pelos direitos humanos em Angola - parte 1” artigo de Susan de Oliveira - (Pós-doutorada em Literatura Comparada pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (2015); doutorada em Literatura (2006), mestrado em Literatura (2001) e graduação em geografia (1993), todos pela Universidade Federal de Santa Catarina entre algumas titulações da professora pós doutorada)

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